quinta-feira, 19 de agosto de 2010

em anos nada mudou...

A Carta do Índio Chefe Seattle, "Manifesto da Terra-Mãe"




Já passaram muitos anos desde que foi escrita, apesar disso, a carta que se

segue, não só continua actual como consubstancia uma crescente preocupação do

homem de hoje.

Foi em 1854 que o chefe Seattle, da tribo Suquamish, do Estado de Washington,

depois de o Governo norte americano ter proposto a compra do território ocupado

por aqueles índios, respondeu ao presidente dos Estados Unidos endereçando-lhe a

missiva que se anexa.

A mesma foi divulgada pela UNESCO em 1976, quando das comemorações do Dia

Mundial do Ambiente.

Não está desfasada das nossas preocupações estéticas e culturais a questão

ambiental ainda que esta temática tenha campo próprio, assim nesse contexto e

ainda pela beleza do texto aqui lhe disponibilizamos a carta.

Quinhentos anos depois da chegada de Pedro Alvares Cabral a Porto Seguro no

Brasil, a preocupação do chefe Seattle natural que era daquele continente, e sem

pretender alimentar polémicas de qualquer espécie, revelou então uma preocupação

à qual felizmente cada vez mais homens e mulheres de hoje, independentemente do

credo filosófico ou religioso com que se identificam, da raça ou do continente

em que se inseram, dão maior importância. E a causa ecológica passou a ser causa

dos povos, e não só do chefe índio.

Ao Chefe Seattle coube a gloria de com o seu perspicaz olhar de homem selvagem,

como ele próprio se intitula , habituado que estava a visualizar o horizonte em

busca de bisontes, que alimentassem a sua tribo, ter vislumbrado antes de todos

a importância da terra mãe para o homem. E viu com o seu arguto olhar que a

terra é nossa mãe e o sol nosso pai, e que podem um dia zangar-se!



Eis o texto da carta:



"Como podeis comprar ou vender o céu, o calor da terra? A ideia não tem sentido

para nós.

Se não somos donos da frescura do ar ou o brilho das águas, como podeis querer

comprá-los? Qualquer parte desta terra é sagrada para meu povo. Qualquer folha

de pinheiro, cada grão de areia nas praias, a neblina nos bosques sombrios, cada

monte e até o zumbido do insecto, tudo é sagrado na memória e no passado do meu

povo. A seiva que percorre o interior das árvores leva em si as memórias do

homem vermelho.

Os mortos do homem branco esquecem a terra onde nasceram, quando empreendem as

suas viagens entre as estrelas; ao contrário os nossos mortos jamais esquecem

esta terra maravilhosa, pois ela é a mãe do homem vermelho.

Somos parte da terra e ela é parte de nós.

As flores perfumadas são nossas irmãs, os veados, os cavalos a majestosa águia,

todos nossos irmãos. Os picos rochosos, a fragrância dos bosques, o calor do

corpo do cavalo e do homem, todos pertencem à mesma família.

Assim, quando o grande chefe em Washington envia a mensagem manifestando o

desejo de comprar as nossas terras, está a pedir demasiado de nós. O grande

Chefe manda dizer ainda que nos reservará um sítio onde possamos viver

confortavelmente uns com os outros. Ele será então nosso pai e nós seremos seus

filhos. Se assim é, vamos considerar a sua proposta sobre a compra de nossa

terra. Isto não é fácil, já que esta terra é sagrada para nós.

A límpida água que corre nos ribeiros e nos rios não é apenas água, mas o sangue

de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, recordar-se-á e lembrará aos

vossos filhos que ela é sagrada, e que cada reflexo nas claras aguas evoca

eventos e fases da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz do pai do meu

pai.

Os rios são nossos irmãos, e saciam a nossa sede. Levam as nossas canoas e

alimentam os nossos filhos. Se lhes vendermos a terra, deveis lembrar e ensinar

aos vossos filhos que os rios são nossos irmãos, e também o são deles, e deveis

a partir de então dispensar aos rios o mesmo tratamento e afecto que dispensais

a um irmão.

Nós sabemos que o homem branco não entende o nosso modo de ser. Ele não sabe

distinguir um pedaço de terra de outro qualquer, pois é um estranho que vem de

noite e rouba da terra tudo de que precisa. A terra não é sua irmã, mas sua

inimiga, depois de vencida e conquistada, ele vai embora, à procura de outro

lugar. Deixa atrás de si a sepultura de seus pais e não se importa. A cova de

seus pais é a herança de seus filhos, ele os esquece. Trata a sua mãe, a terra,

e seu irmão, o céu, como coisas que se compram, como se fossem peles de

carneiro ou brilhantes contas sem valor. O seu apetite vai exaurir a terra,

deixando atrás de si só desertos. E isso eu não compreendo.

O nosso modo de ser é completamente diferente do vosso. A visão de vossas

cidades faz doer os olhos do homem vermelho.

Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não compreende...

Nas cidades do homem branco não há um só lugar onde haja silêncio, paz. Um só

lugar onde ouvir o desabrochar das folhas na primavera, o zunir das asas de um

insecto. Talvez seja porque sou um selvagem e não possa compreender.

O vosso ruído insulta os nossos ouvidos. Que vida é essa onde o homem não pode

ouvir o pio solitário da coruja ou o coaxar das rãs nas margens dos charcos e

ribeiros ao cair da noite? O índio prefere o suave sussurrar do vento esfolando

a superfície das águas do lago, ou a fragrância da brisa, purificada pela chuva

do meio dia e aromatizada pelo perfume dos pinhais.

O ar é inestimável para o homem vermelho, pois dele todos se alimentam. Os

animais, as árvores, o homem, todos respiram o mesmo ar. O homem branco parece

não se importar com o ar que respira. Como um cadáver em decomposição, ele é

insensível ao mau cheiro. Mas se vos vendermos nossa terra, deveis recordar que

o ar é precioso para nós, que o ar insufla seu espírito em todas as coisas que

dele vivem. O vento que deu aos nossos avós o primeiro sopro de vida é o mesmo

que lhes recebe o último suspiro.

Se vendermos nossa terra a vós, deveis conservá-la à parte, como sagrada, como

um lugar onde mesmo um homem branco possa ir saborear a brisa aromatizada pelas

flores dos bosques.

Por tudo isto consideraremos a vossa proposta de comprar nossa terra.

Se nos decidirmos a aceitá-la, eu porei uma condição: O homem branco terá que

tratar os animais desta terra como se fossem seus irmãos.

Sou um selvagem e não compreendo outro modo de vida. Tenho visto milhares de

bisontes apodrecendo nas pradarias, mortos a tiro pelo homem branco de um

comboio em andamento.

Sou um selvagem e não compreendo como o fumegante cavalo de ferro possa ser mais

importante que o bisonte, que nós caçamos apenas para sobreviver.

Que será dos homens sem os animais? Se todos os animais desaparecem, o homem

morrerá de solidão espiritual. Porque o que suceder aos animais afectará os

homens. Tudo está ligado.

Deveis ensinar a vossos filhos que o solo que pisam são as cinzas de nossos avós.

Para que eles respeitem a terra, ensina-lhes que ela é rica pela vida dos

seres de todas as espécies. Ensinai aos vossos filhos o que nós ensinamos aos

nossos: Que a terra é a nossa mãe. Quando o homem cospe sobre a terra, cospe

sobre si mesmo. De uma coisa nós temos certeza: A terra não pertence ao homem

branco; o homem branco é que pertence à terra. Disso nós temos a certeza. Todas

as coisas estão relacionadas como o sangue que une uma família. Tudo está

associado. O que fere a terra fere também aos filhos da terra.

O homem não tece a teia da vida: é antes um dos seus fios. O que quer que faça a

essa teia, faz a si próprio.

Nem mesmo o homem branco, cujo Deus passeia e fala com ele como um amigo, não

pode fugir a esse destino comum. Por fim talvez, e apesar de tudo, sejamos

irmãos.

Uma coisa sabemos, e que talvez o homem branco venha a descobrir um dia: o nosso

Deus é o mesmo Deus.

Hoje pensais que Ele é só vosso, tal como desejais possuir a terra, mas não

podeis. Ele é o Deus do homem e sua compaixão é igual tanto para o homem branco,

quanto para o homem vermelho.

Esta terra tem um valor inestimável para Ele, e ofender a terra é insultar o seu

Criador. Também os brancos acabarão um dia talvez mais cedo do que todas as

outras tribos. Contaminai os vossos rios e uma noite morrerão afogados nos

vossos resíduos.

Contudo, caminhareis para a vossa destruição, iluminados pela força do Deus que

vos trouxe a esta terra e por algum desígnio especial vos deu o domínio sobre

ela e sobre o homem vermelho. Este destino é um mistério para nós, pois não

compreendemos como será no dia em que o último bisonte for dizimado, os cavalos

selvagens domesticados, os secretos recantos das florestas invadidos pelo odor

do suor de muitos homens e a visão das brilhantes colinas bloqueada por fios

falantes. Onde está o matagal? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu.

Termina a vida começa a sobrevivência."

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